Florais caninos

De Sexta Poética
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Um mês passou, muita coisa aconteceu, de grandes importâncias e comezinhas, é relativo o grau de cada uma. Sempre devem ser sopesadas frente a outra entidade; se de muita ou pouca importância o certo é que existem e são levadas em consideração. A visita mensal à podóloga entra nesse rol. O chacareiro enquanto dava um tempo ao tempo de mais pessoas passarem antes e menos carros estarem passando na rodovia dedicou-se a misturar ingredientes e conjuminar substâncias, adora fazer pão. Para o dejejum preparou também um belo tresemesumele, salada de mamão, manga, maçã e laranja.

  Quando pegou a vicinal Sobradinho dos Melos, quem por obrigação de horário vai com o pé pesado no acelerador já passou e permite que o chacareiro diminua a marcha e passe a dez por hora observando bem embaixo do pé de imbaúba o algodãozinho do cerrado Cochlospermum regium que abriu sua flor amarela e está querendo secar, proporcionando-lhe as sementes – seu quintal vai se enriquecendo de ornamentais nativas. O caminho é sempre ou quase sempre o mesmo, DF 250 até o Paranoá, segue na Estrada do Tamanduá até a EPPR, Estrada Parque Paranoá, que liga o Lago Norte à “Paranoa Dam”, como ostentava o padrão FIFA nas placas durante a Copa do Mundo, do Lago Norte pega o Eixão Norte na Ponte do Bragueto, passa o buraco do tatu na rodoviária, sai no Eixão na Asa Sul e passa para o eixinho de cima, o W, pela agulhinha da 109, faz a tesourinha do Rua do Beirute, passa em frente ao Cine Karin e já está bem próximo da podóloga, na CLS 112. Hoje porém ele vai passar direto até 113/14, vai atrás de alecrim fresco na japonesa do bloco de baixo, rua que é da Igreja Presbiteriana de Brasília, onde há 40 anos fez profissão de fé. Achou o que procurava, não na igreja onde andou atrás de paz de espírito, reconhecimento social e cumpriu um dever de gratidão à comunidade evangélica, mas o alecrim fresco sim, achou na mercearia e frutaria da japonesa, como foi dito, no bloco de baixo. Um lugar pra cada coisa, cada coisa no seu lugar.

  Com todo paramento, máscara e face shield, o chacareiro fez o que era suposto fazer. Alecrim comprado, podóloga aqui vamos nós, subiu a rua pelo lado da 13, fez o balãozinho, rotatória para os menos íntimos, e desceu a mesma rua pelo lado da 14. Não muito leva para aprender que nas quadras comerciais 100 da Asa Sul, a rua sobe pelo ímpar e desce pelo par. Desceu e entrou pelo tobogã, mas não passa nem pelo primeiro “vai da valsa”, aquele frio na barriga, já faz a primeira tesourinha para pegar o Eixinho de cima, W já sabem, no sentido rodoviária e voltar para a CLS 111/112. Se fosse desenhar essa volta seria assim mais ou menos como uma pista de autorama com seus oitos apertados. Um observador a 500 metros de altura veria com estranheza uma espécie de hieróglifo, um grafismo capaz de aturdir, de siderar quem esta altura alcançasse, de pô-lo perplexo diante, ou melhor, acima dessa cidade enigmática.

  Mas o relato da visita à podóloga dessa feita já está se alongando e para abreviar convem anotar os demais pormenores, que são muitos, e reserva-los para incluir noutra crônica. Nesta pega bem apenas ainda justificar o título, lembrando que voltando para o seu reino, já próximo à saída norte da cidade, já respirando a transição urbano-rural, o chacareiro passou em busca de alimento para os cães e deu com uma inusitada solução para o incômodo do Dick com seu latido ininterrupto, intempestivo, inconveniente e impossível de ser tolerado: Biofloral, 6 gotas três vezes ao dia sem encostar na boca nem na língua. É experimentar pra ver se vai dar certo.